quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

FEBRE DO RATO



Brasil, 2011
Direção: Claudio Assis

Uma porrada seguida de um abraço, talvez essa seja a melhor maneira para explicar o mais recente trabalho de Claudio Assis. Amarelo Manga e Baixio das Bestas fogem ao esquema, pois somente a porrada encontra-se presente, mas Febre do Rato nos apresenta um diretor mais "amaciado", contudo, sem nunca deixar a contravenção, a polêmica e o crú visceral. Essas características estão no sangue de Assis, pelo menos até que o próxime filme prove o contrário.

Febre do Rato é o nome do jornaleco bancado pelo poeta Zizo, interpretado magistralmente por Irandhir Santos. O nome do jornal é uma expressão popular utilizada em Recife e que quer dizer alguém fora de controle. 

Anárquico, Zizo é um tipo de profeta/messias de uma turma que lembra muito uma comunidade hippie. Todo mundo come todo mundo, todo mundo divide a comida, as drogas e outros prazeres.

Através de sua poesia ele tenta espalhar suas ideias e ideais anárquicos  por "Hellcife". Marginal, presenteia seus colegas com versos e vive intensamente. Revoltado e doce ao mesmo tempo. 

O filme não incomoda como seus trabalhos anteriores. A sinceridade revolta de Zizo encontra conforto na ternura de suas palavras e na beleza da fotografia em preto e branco do mestre Walter Carvalho. Eneida (Nanda Costa) chega para tumultuar a cabeça do poeta, provocando uma verdadeira "guerra" em seus sentimentos. Difícil não lembrar de Waly Salomão. Zizo lembra muito o poeta carioca. 

O filme ainda conta com a presença do sempre ótimo Matheus Nachtergaele, que faz o papel de um coveiro que vive uma relação amorosa impetuosa com um travesti. No elenco ainda têmos o excelente Juliano Cazarré e presenças um tanto inesperadas como o pianistaVitor Araújo e a veterana atriz Maria Gladys.

O submundo recifense torna-se muito envolvente no roteiro de Hilton Lacerda, que teve colaboração de Xico Sá. A trilha de Jorge Du Peixe sela essa belezura de filme de tal maneira, que os acertos se sobrepõem a qualquer erro que algum crítico mesquinho tente encontrar na obra. 

Endiabrado. Louco. Zizo é tudo isso e muito mais. Ele vai além, está além. É um personagem crú, visceral e marginal. Um poeta do povo, que luta pelo povo de maneira contagiosa e empolgante. 

O filme vai totalmente na contramão da grande indústria cinematográfica (se é que existe uma no Brasil), mas a "revolta" instigante de Assis, aparece aqui um tanto mais parcimoniosa. A essência anárquica porém, está mais presente do que nunca.

Um filme para poucos, assim como todos dele. Sorte de quem aprecia. Pra fechar, um poema do endiabrado Zizo.

“Valetes a varejo”.
Assim, só sendo assim, posso falar
Das espadas que são nós.
Nós que se enrolam e se vertem
De forma tão infinita que nem a lâmina
(fina e precisa)
Consegue desfazer
A corda atada a nós.
Nem as espadas outras,
Mesmo que pareçam singelas,
Tem o poder de ferir e inferir.
Mesmo que seja fundo o corte
E mesmo que seja fácil,
O tempo todo nós:
Ali, Acima, abaixo.
Superfície e espelho de nós,
Que nada parece mudar e desfazer.
E quando o tempo deixar nós cegos
Vamos à beira do rio
(espelho ruminante da cidade)
Pensar em desatar.
…será tarde.
E no fluxo rio das idéias
Nós vão indo, afeitos, refeitos, rarefeitos…
E lá vão eles juntos. Afoitos se completam…
Eles nós. Cheios de nós.
Reinventam-se a cada dique: açudes.
E rompem Sobre nós, sob nós, sobre nós.







2 comentários:

  1. "Sexo, poesia e anarquia, ao som de mangue beat". Foi assim que o filme ficou pra mim quando saí da sessão, em êxtase.
    A melhor estreia nacional do ano passado!

    E você tem que ver o "O Som ao Redor"! Rapaz, que filme! O Min. da Cultura TEM que indicá-lo ao Oscar /2014!!! Dificilmente apareça outro neste ano tão 'redondinho'...

    Abraço!

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resmunga ai