quarta-feira, 28 de julho de 2010

ANATOMIA FROZEN


Texto: Bryony Lavery
Direção: Marcio Aurelio
Elenco: Joca Andreazza e Paulo Marcello
Tradução: Rachel Ripani
Adaptação: Cia. Razões Inversas
Quando conferi "Agreste" no ano passado, com a mesma equipe e elenco de "Anatomia", tornei-me fã da Cia. Razões inversas e consequentemente destes dois excelentes atores.
Como em "Agreste", "Anatomia" conta com uma cenografia simplória e um figurino enxuto. Com dois atores de peso como estes, qualquer extra é mera bobagem. Eles não precisam de grandes aparatos para envolver o espectador e é ai que vêmos a verdadeira magia do teatro.
"Anatomia Frozen" é uma peça com um texto forte e pesado que vale cada minuto. Infelizmente muita gente ainda tem aquela ideia de que teatro é tudo comédia e quando depara-se com algo fora do contexto, faz caras e bocas. Pude conferir algumas destas caras assustadas diante do texto de Bryony Lavery. Informem-se gente!
A peça aborda um tema muito polêmico e tão em voga em tempos de internet: pedofilia. Têmos então três narrativas entrelaçadas. A psquiatra que escreve uma tese sobre assassinatos em série, o pedófilo e psicopata condenado a prisão perpétua e a mãe de uma de suas vítimas.
Os três personagens encontram-se congelados em seus estados emocionais. Primeiramente temos a apresentação da psiquiatra, depois o encontro dela com o psicopata, onde o texto tenta dissecar a mente e a origem deste assassino. A mãe de uma de suas vítimas é apresentada e para concluir, o grande encontro entre mãe e assassino, o ápice desta poderosa encenação.
Com interpretações divinas, um texto bem amarrado com uma bela direção e uma trilha envolvente e angustiante, posso afirmar que "Anatomia Frozen" é merecedora de todos os elogios e prêmios que vem arrebatando. Prêmios como o APCA de melhor diretor, CPT de melhor elenco e a indicação ao Prêmio Shell de melhor diretor.
É uma peça para amantes do Teatro. Se você está atrás de comédia, não perca tempo e poupe os outros de suas caras de tédio e espanto. Stand up Comedy tá cheio por aí.
A peça encerrou a temporada em São Paulo e irá iniciar excursão Brasilzão afora, mas quando ela voltar, não perca a chance de conferir.



quarta-feira, 14 de julho de 2010

A CINCO HORAS DE PARIS


Israel, 2009
Direção: Leon Prudovsky

Não há como negar, sou fã assumido do cinema israelense. Alguns dos melhores filmes que conferi nos últimos anos são daquele país. Filmes como "As Coisas que o Sol Esconde", "Beaufort" e "Valsa com Bashir", são apenas alguns exemplos recentes, sem contar os clássicos de Amos Gitai.

Não é a toa que sua cinematografia diferenciada vem conquistando o mundo, sendo difundida cada vez mais, thanx god!

Nesta semana teve início a 3º Mostra Audiovisual Israelense que traz para Sampa city o melhor do cinema recente israelense. São 12 filmes inéditos com destaque para "Ajami" indicado ao Oscar de filme estrangeiro 2010 e "Phobidilia". Se não bastasse o Centro de Cultura Judaica ainda promove debates e workshops com os diretores. Tudo na faixa!

Ontem foi a sessão de abertura onde pude conferir o simpático e cruel "A Cinco Horas de Paris".

O filme conta a história de um motorista de táxi que se apaixona pela professora de música de seu filho. Ele é separado, ela casada. Como seu psicólogo lhe diz: não, não é errado você se apaixonar por alguém casada, ele compra a ideia e vai atrás de sua felicidade.

Ele estava carente, mas ela não, tanto que nunca escondeu dele que seu marido estava viajando e acertando tudo para que se mudassem de país. E quem disse que o coração tem regras? Impossível delimitar quando ele deve ou não apaixonar-se, e mesmo não procurando, não estando triste, abandonada ou insatisfeita, simplesmente aconteceu.

A primeira metade do filme é divertida, vale principalmente pelo ótimo protagonista que nos proporciona boas risadas. A direção é segura e o roteiro, realista. O filme perde um pouco de sua força na segunda metade, mas a conclusão segura a qualidade da película.

Pois é, tudo que é bom dura pouco, mas quando você sabe que o sonho tem hora marcada pra terminar, o sentimento é mais cruel. Ainda bem que este não é o caso para o ciinema israelense, que nos últimos 3 anos, teve filmes indicados para o Oscar de filme estrangeiro. Não que isso represente muita coisa, mas definitivamente, é um belo reconhecimento.

veja mais em: www.culturajudaica.uol.com.br/programacao/





BRILHO DE UMA PAIXÃO


Inglaterra/Austrália, 2009
Direção: Jane Campion

O que realmente me atraiu neste filme foi o chamariz Jonh Keats, um dos maiores nomes da poesia do romantismo inglês.

Como toda cinebiografia, infelizmente, ja entramos na sala sabendo o final, mas sempre tento abstrair este "detalhe". Muitas vezes o diretor nos leva a caminho mágicos que somente na conclusão a verdade vêm a tona e lembramos que já sabíamos aquela história. Não é o caso de "Brilho de uma Paixão".

Jane campion, diretora de "O Piano", não soube apresentar o poeta Jonh Keats para o mundo. Sua vida foi curta? Ok, mas isso não é desculpa para arrastar tanto o filme. Não tem assunto, encurta, não é nenhum demérito, ja que não teve a capacidade de explorar outras facetas deste grande poeta. (Keats faleceu de tuberculose aos 26 anos)

O filme todo mostra a paixão quase que adolescente de Keats por Fanny Brawne. Claro que ela não deveria ficar de fora, mas resumir a vida de Jonh Keats a sua paixão por Fanny, é muito pouco. Mas claro, as pessoas adoram histórias de amor. Aliás, uma história maçante e chata nas maõs de Campion.

Keats nunca foi reconhecido enquanto vivo, pelo contrário, sempre foi duramente criticado. O clímax da história de Campion esta no fato de Keats não possuir um dote para poder pedir Fanny em casamento. Sim, naquela época, simplesmente amar não bastava. Por isso, essa louca paixão nunca foi pra frente. Não que Fanny tenha exigido o dote de Keats, mas você sabe como é, família, família .... Sem contar que Keats era um homem de princípios. Enfim, o filme resume-se a esse vai e vêm desagradável.

No fim das contas você sai sabendo somente o básico da vida deste grande homem. Sua poesia, sua vida, suas inspirações e inquietações, ficaram reduzidas a 2 horas de uma paixão chatonilda.

Fiquemos portanto com as belas palavras de Keats: "Quase desejo que fossêmos borboletas e vivêssemos somente três dias de verão. Três dias a seu lado, e poderia preenchê-los de mais encanto do que 50 dias comuns jamais teriam."

ps: postarei aqui link com um trecho de "Endymion", uma de suas grandes obras, traduzida por Augusto de Campos. Deleite.




terça-feira, 13 de julho de 2010

O ESCRITOR FANTASMA


EUA, 2010
Direção: Roman Polanski

Imagine Tony Blair, ex-Primeiro Ministro inglês, sendo condenado daqui a 10 anos por crimes de guerra. Absurdo? Sinceramente acho que não, embora seja improvável. Bem que ele merecia passar um susto por ter apoiado George Bush, mas isso não vem ao caso.
Nesta volta de Polanski, que finalizou o filme da prisão, têmos um suspense político repleto de enigmas, aquele velho quebra-cabeça característico do gênero.
Ghost writer é contratado para escrever as memórias de um ex-primeiro ministro da Inglaterra. Na verdade, a história é do escritor substituto, pois claro, o antecessor fôra assassinado pois descubriu coisas que iriam além do lenga lenga de uma biografia política.
O novo contratado, interpretado por Ewan McGregor, também descobre as tais pedras no sapato do ex-primeiro ministro, mas já estava preparado por saber do desfecho de seu antecessor.
O climão de suspense esta no ar, trata-se de cinemão a moda antiga, com reviravoltas e descobertas "surpreendentes". Pelo menos assim Polanski gostaria que fosse.
Apesar de gostar do gênero, saí um tanto decepcionado da sessão. Sim, esperava mais. As interpretações estão ok, mas nada demais. A escolha do elenco foi razoável. Não achei que ninguém foi muito convicente, mas com certeza, a presença de Kim Cattrall, a tarada de Sex and the City, no papel de amante do ministro não convence, aliás, acho que ela não convence em nenhum outro papel a não ser o da taradona.
O roteiro até que é bom, mas talvez a maneira como Polanski tenha levado o filme, fez deste, apenas mais um entre tantos no gênero. Entretém, mas a obviedade é o maior pecado em tratando-se de suspense político e a conclusão preguiçosa, não ajudou em nada. Sobrou política. Faltou cinema.





segunda-feira, 12 de julho de 2010

ENDYMION (TRECHO)

Autor: Jonh Keats
Tradução: Augusto de Campos

Endymion (trecho)

O que é belo há de ser eternamente
Uma alegria, e há de seguir presente.
Não morre; onde quer que a vida breve
Nos leve, há de nos dar um sono leve,
Cheio de sonhos e de calmo alento.
Assim, cabe tecer cada momento
Nessa grinalda que nos entretece
À terra, apesar da pouca messe
De nobres naturezas, das agruras,
Das nossas tristes aflições escuras,
Das duras dores. Sim, ainda que rara,
Alguma forma de beleza aclara
As névoas da alma. O sol e a lua estão
Luzindo e há sempre uma árvore onde vão
Sombrear-se as ovelhas; cravos, cachos
De uvas num mundo verde; riachos
Que refrescam, e o bálsamo da aragem
Que ameniza o calor; musgo, folhagem,
Campos, aromas, flores, grãos, sementes,
E a grandeza do fim que aos imponentes
Mortos pensamos recobrir de glória,
E os contos encantados na memória:
Fonte sem fim dessa imortal bebida
Que vem do céus e alenta a nossa vida.

Endymion (trecho)

A thing of beauty is a joy for ever:
Its loveliness increases; it will never
Pass into nothingness; but still will keep
A bower quiet for us, and a sleep
Full of sweet dreams, and health, and quiet breathing.
Therefore, on every morrow, are we wreathing
A flowery band to bind us to the earth,
Spite of despondence, of the inhuman dearth
Of noble natures, of the gloomy days,
Of all the unhealthy and o'er-darkened ways::
Made for our searching: yes, in spite of all,
Some shape of beauty moves away the pall
From our dark spirits. Such the sun, the moon,
Trees old and young, sprouting a shady boon
For simple sheep; and such are daffodils
With the green world they live in; and clear rills
That for themselves a cooling covert make
'Gainst the hot season; the mid forest brake,
Rich with a sprinkling of fair musk-rose blooms:
And such too is the grandeur of the dooms
We have imagined for the mighty dead;
All lovely tales that we have heard or read:
An endless fountain of immortal drink,
Pouring unto us from the heaven's brink.

terça-feira, 6 de julho de 2010

O PROFETA


França, 2009
Direção: Jacques Audiard

Pós-graduação no crime. O tão badalado e comentado filme francês não chegou a encher meus olhos, mas com certeza é merecedor de todos os prêmios que recebeu, entre eles Cannes, o César (Oscar do cinema francês) e a indicação ao Oscar de filme estrangeiro.

Temos aqui a história do jovem Malik, meio árabe, meio italiano, interpretado pelo excelente Tahar Rahim. Malik chega a prisão não se sabe o motivo. Muito jovem, vai ganhando a confiança do todo poderoso italiano que domina o local. Tal proximação dos italianos faz com que a parte muçulmana da prisão o rejeite.

Devido ao bom comportamento e com uma mãozinha do chefão italiano, Malik começa a receber direito a saídas esporádicas da prisão. Nestas saídas, realiza serviços para o italiano e procura sua própria subsistência.

O filme traz alguns clichês das películas de prisão, mas até ai normal, como já disse antes, o que importa é saber trabalhar os clichês, afinal, é quase impossível realizar um filme sem eles. Seu diferencial está na interpretação de primeira de Tahar e do elenco coadjuvante.

Chegaram a comparar com "O Poderoso Chefão", mas péra lá, menos. O filme é bom, mas não é para tanto.
A grande sacada está no título. Por que "O Profeta"? Bom, cada um tira sua própria interpretação, mas acreditar que tudo que foi feito por Malik já estava premeditado, faz com que o filme ganhe e muito como um todo.




sexta-feira, 2 de julho de 2010

POEMA DE AMOR

Este é um poema de amor
por isso nele
não poderá faltar
a menção a alguma
flor
e por isso digo
rosa
ou lírio
ou simplesmente
rubro,
rubro e espero as páginas
imantarem-se
de vermelho
por isso digo
febre
e noite
e fumo
para dizer
ansiedade e
desperdício de sêmen e de horas
e cigarros à janela
com a noite numa ponta
e nós
consumindo-nos
na outra
este é
definitivamente
um poema de amor
por isso nele
devo dizer casa
e olhos
e neblina
e não devo dizer
que o amor é uma doença
uma doença do pensamento
uma desordem que põe tudo o mais
em desordem
uma perda que põe tudo
a perder
e porque é
um poema de amor
sob pena de ser devolvido
como uma carta sem destinatário
(e todos sabem que não se deve
brincar com os correios)
este poema deve dirigir-se
a alguém
porque a alguém o amor deve ferir
com sua pata negra
e então
à falta de outro
este poema
eu o dedico (mas não tema,
o tempo
também nisso
porá termo)
a você.

Ana Martins Marques

O BRINCO

Pode ser que como as estrelas
as coisas estejam separadas
por pequenos intervalos de tempo
pode ser que as nossas mãos
de um dia para o outro
deixem de caber
umas dentro das outras
pode ser que no caminho para o cinema
eu perca uma de minhas ideias
preferidas
e pode ser
que já na volta
eu me tenha resignado
alegremente
a essa perda
pode ser
que o meu reflexo sujo
no vidro da lanchonete
seja uma imagem de mim
mais exata
do que esta fotografia
mais exata do que a lembrança
que tem de mim
uma antiga colega de colégio
mais exata do que a ideia
que eu mesma
agora tenho de mim
e portanto pode ser
que a moça cansada
de olhos tristes
que trabalha na lanchonete
tenha de mim uma imagem
mais fiel
do que qualquer outra pessoa
pode ser que um gesto
um jeito de dobrar
os lábios
te devolva
subitamente
toda a infância
do mesmo modo que uma xícara
pode valer uma viagem
e uma cadeira
pode equivaler a uma cidade
mas um cachorro estirado ao sol não é o sol
e uma quarta-feira não pode ser o mesmo que
uma vida inteira
pode ser
meu querido
que esquecendo em sua cama
meu brinco esquerdo
eu te obrigue mais tarde
a pensar em mim
ao menos por um momento
ao recolher o pequeno círculo
de prata
cujo peso
o frio
você agora sente nas mãos
como se fosse
(mas ó tão inexato)
o meu amor.

Ana Martins Marques